Sinopse
1942. No Portugal salazarista, dois refugiados franceses, Boris e Laura, são presos. O inspector Vargas, sentindo-se atraído pela jovem mulher, decide escondê-los em sua casa: um hotel vazio onde vive com a filha, Ilda, e a mulher, gravemente doente. Ilda descobre a presença dos refugiados e, consumida pelo ciúme, tenta fazê-los desaparecer a todo o custo…
A intenção primeira, e determinante, é propor uma imagem de um período da História de Portugal, durante o qual o país, submetido a uma ditadura impiedosa, foi ao mesmo tempo, de certa forma e paradoxalmente, um oásis de paz num mundo em guerra, um refúgio para milhares de pessoas que, sem ele, teriam perdido a vida.
Praticamente toda a acção se desenrola no recinto fechado de um hotel, num huis-clos semelhante à situação do país durante a ditadura, isolado do resto do mundo e da história que aí se faz.
Um décor único, portanto, crepuscular, feito de longos corredores sombrios, portas fechadas, salas mergulhadas numa penumbra povoada pelos lívidos fantasmas dos móveis protegidos por lençóis.
As tiras de papel que, na época, quadrilhavam os vidros das janelas, para prevenir os estilhaços de hipotéticos bombardeamentos, filtrando a luz exterior, concorrem para criar uma atmosfera opressiva de aquário, reforçada pelas fotografias de água (mar, rios, lagos, cascatas) que decoram obsessivamente as paredes do hotel.
No interior, as personagens parecem derivar entre duas águas, ao sabor de desejos exacerbados pela clausura.
Uma imagem em claro-escuro de um mundo a que só os ruídos exteriores fazem chegar ecos esporádicos da vida urbana e, através do rádio e dos farrapos da banda sonora das actualidades do cinema vizinho, o estrépito abafado da guerra que continua lá fora.
Carlos Saboga